sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Dia das crianças


Como sempre neste país atrasado que vivemos a violência contra a criança permanece impune. A justiça segue sem pressa para julgar a agressão contra meu filho, mas foi bem apressada para julgar o pagamento de pensão. A agressão é recompensada com dinheiro, para delírio daqueles que se divertem as custas do futuro e felicidade do Francisco.

Muitos que me apoiam nesta jornada insistem em dizer que meu filho verá com o tempo a agressão a qual é submetida e se voltará contra a família materna quando for mais velho. No entanto como fica toda a vida do Francisco comigo e com minha família? Será mesmo correto esperar pela "justiça divina"? Para que serve todo este aparato judicial? Eles não deveriam agir em prol dos interessem das crianças?

São tantas perguntas perante tamanha injustiça que fico sem direção do que fazer. Até quando devo esperar a justiça fazer algo para proteger meu filho, se é que o fará? Será que devo fazer como tantos pais e aguardar meu filho completar 10 ou 12 anos de alienação e torcer para que ele queira ter contato comigo numa idade que possa tomar esta decisão?


QUERO O DIREITO DE TER ACESSO INTEGRAL AO MEU FILHO JÁ!


Chega deste inferno. Cansei de ser preso, humilhado, lesado e, principalmente, continuar afastado do Francisco.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Pai Herói

A história de minha viagem para Recife aconteceu por estímulo de meu pai, que é aposentado e apaixonado pelo ciclismo. Seu sonho desde muitos anos era seguir para Fortaleza, terra que moramos muitos anos, de bicicleta. Sua vontade era conhecer as vilas de pescadores e as pequenas cidades que compõe a rota até lá. Acabei fazendo a viagem para Recife por uma razão completamente diferente da dele e por muito tempo nossa família passou por vários percalços por conta do rapto do Francisco.

Toda a briga para recuperar meu filho raptado fez com que o sonho do meu pai fosse postergado até o dia de hoje. As 05h30 da manhã ele dará partida rumo a Fortaleza, seguindo praticamente os mesmos caminhos e trilhas que fiz até Recife, e continuando pelo litoral até Fortaleza, retornando posteriormente pelo sertão nordestino.

Eu o ajudarei nesta viagem mantendo seu blog e recebendo as fotos da viagem. Também ficará disponível no site o acompanhamento em tempo real de sua posição.



sexta-feira, 22 de julho de 2011

Paternidade: Relato de um criminoso

Após o rapto do meu filho e a retirada judicial de sua guarda, nada mais me restou senão abandonar tudo em Campinas – trabalho, amigos e família, e seguir minha vida na cidade de Recife. É claro que sabia na época que isso implicaria em sérios transtornos financeiros, coisa informada ao judiciário.


Durante os 8 meses de permanência na cidade consegui melhorar significativamente de situação. Voltei a fazer compras para a casa e até me dar ao luxo de sair algumas vezes. Entrava para um dos melhores momentos agora, com uma viagem de trabalho programada na quarta-feira para o Rio de Janeiro que resolveria muito da minha problemática financeira. Neste tumulto existia uma dívida estranha: a pensão alimentícia. Baseado no binômio possibilidade-necessidade deveria ser instituído um valor para ajudar na mantença do meu filho. Contudo, a despeito da minha condição inicial aqui, a justiça foi completamente inflexível quanto ao valor a ser pago e determinou um valor completamente impossível de ser honrado por mim dado as circunstâncias. A consequência era óbvia – a detenção por falta de dinheiro.

Logo no começo da tarde de segunda-feira me chamaram a porta do pequeno apartamento que moro, no térreo. Como se trata de um prédio muito simples, não existe portaria e nem elevadores, dando acesso diretamente a rua. Ainda tomava meu “café da manhã”, pois havia trabalhado até altas horas no dia anterior.

Ao atender minha porta, vejo um grupo de umas 4 ou 5 pessoas do lado de fora. Minha impressão inicial é que seriam da área de assistência social do judiciário, até que ficou aparente a arma no bolso de uma das pessoas. Nesta hora o nervosismo tomou conta de mim. Fui abrir o portão da frente para que pudessem entrar e imediatamente as duas mulheres presentes, oficiais de justiça, começaram a me instruir como proceder para ser recolhido. Foram gentis demais comigo, entendendo meu nervosismo e me orientando para desligar o computador que estava trabalhando e verificar se não tinha mais nenhum eletrônico ligado. Me lembraram de fechar as janelas, trancar a porta, guarda o carro e sair. Foram extremamente respeitosas comigo a me pouparem da extra humilhação da algema, apesar de estar sempre na fiel companhia de um policial para garantir que não fizesse nada em desacordo. Como não é de meu feitio nada do gênero, fomos para a delegacia de forma pacífica.

Chegando lá, fiz as ligações possíveis enquanto registravam minha detenção. Como somente tenho contato com uma única pessoa nesta região do país, foi a ela quem recorri para avisar a meus familiares sobre o que estava acontecendo. Passados todos os telefones, fui encaminhado para o IML e após para o COTEL, que é um presídio de triagem. A última mensagem que recebi em meu celular foi “Depositado!” antes de tê-lo recolhido.

Fiquei feliz por terem conseguido o dinheiro tão rapidamente e acreditei que sairia de lá imediatamente. Eram umas 16h30 quando adentrei ao presídio. Começamos por um processo de revista extremamente desagradável, apesar da cordialidade de todos até este momento. Os presos foram instruídos para seguirem algumas poucas regras que era “andar com as mãos pra trás, cabeça baixa, responder sempre 'sim senhor' e 'não senhor' e obedecer a quaisquer determinações”.

Após a revista, fui orientado a ir até a ala prisional, sempre de cabeça baixa e mãos pra trás, e informar que deveria ser encarcerado por pensão. Desta maneira fui encaminhado para a cela 3, chamada de “cela dos tarados”, que era a mais pacífica das 3. Era uma área de cerca de 15m², com cerca de 10m² de área útil, sendo o resto ocupado por uma bacia e um cano que servia de chuveiro. Naquele momento não haviam mais que 20 prisioneiros. Minha imediata recepção foi por dois travestis que vieram dar as primeiras regras da cela. Deveria tirar o chinelo e tomar um banho, o que fiz prontamente. Emprestaram a mim uma toalha e um sabonete e, assim que saí de lá, me pediram dinheiro. Pelo pavor daquele lugar e por não conhecer as regras, imediatamente tirei todo meu dinheiro, R$ 14,00, e entreguei a mão dos travestis.

Um senhor de 34 anos, completamente ferido e usando uma tala se levantou e gritou para que me devolvessem o dinheiro. Os travestis devolveram o valor e se explicaram dizendo que somente haviam perguntando se poderia lhe dar um cigarro e que não haviam pedido nada demais. Esta pessoa se dirigiu a mim e perguntou de onde era. Expliquei que era de Campinas e ele retrucou: “Estive preso em Hortolândia! Me conte como está o lugar! Vamos conversar”. Comecei a explicar um pouco da minha história, da viagem de bicicleta e da situação do meu filho, onde muitos dos detentos escutaram atentamente. Ele me contou que era um triplo homicida, em ocasiões distintas, e que estava naquela cela de castigo por ter ferido (ou matado, ele não sabe se sobreviveu) um último prisioneiro que brincou com seu “sotaque paulista” e teve como retaliação um banho de água fervente no rosto enquanto dormia. Me contou que teve o “sono perturbado” porque o rosto daquele homem havia sido “arrancado” pela água e ele achou aquilo muito nojento.

Depois ele avisou para a cela que ninguém deveria tocar a mão e mim e chamou por uma pessoa (não me recordo o nome) para confirmar isso. Então uma voz forte soa de dentro do banheiro confirmando. Pouco depois ele saiu de lá e pude ver uma pessoa de grande porte e estatura e que, vim a saber, havia surrado a esposa. Ficou mais que claro que eram eles quem mandavam naquela cela.

A conversa continuou e o “paulista”, como chamavam aquela pessoa que estava ferida, me explicou que ele teve o pé quebrado pelos chutes que os policiais lhe deram depois do incidente. Conta ele que foi algemado, derrubado ao chão, e chutado incansavelmente. Estas conversas ajudaram a passar o tempo, mas me preocupava o porque ainda não estava solto. Já havia passado várias horas desde recebi a mensagem dizendo que a pensão havia sido paga.

Chegou a hora da janta e foi servido um sopão e pão. Não estava com fome por conta de todo o nervosismo, mas fui orientado a pegar os dois pães que havia direito, seja para matar minha fome depois como para partilhar com a cela posteriormente. Segui atentamente as orientações.

Logo, um senhor grita “tem um velho mijando no banheiro!”. Um senhor com uma certa idade havia urinado na área de banho e duas pessoa da cela foram “educá-lo”. Ouvia-se as pancadas abafadas que seguiram por alguns minutos, junto com a ordem para que limpasse o banheiro. Este senhor ficou alguns minutos no banheiro fazendo este serviço enquanto era supervisionado por uma pessoa. Quando terminou de limpar, voltaram a espancá-lo.

Ao assistir esta cena fiquei apavorado e imóvel, pois não me atreveria a intervir no que estavam fazendo. Estava fora das minhas mãos questionar qualquer coisa que acontecesse ali dentro. Com o adentrar da noite, mais e mais prisioneiros foram levados para as 3 celas que lá haviam, lotando o lugar. Pude contar um máximo de 40 presos distribuídos pelos 10 m² de cela, o que não permitia que todos pudessem encontrar lugares para ficar em pé, e ficando literalmente uns sobre os outros. Os mais antigos na cela dormiam em cima ou embaixo dos bancos. Dois optaram por dormir sobre a urina que se espalhava pelo banheiro e eu preferi me manter em pé por toda a noite, pois não havia espaço melhor para isso. Conforme o calar da noite apagaram as luzes e pude passar uma eternidade reflexiva, imaginando que logo pela manhã estaria fora daquele inferno.

No alto da madrugada começam a chamar por nomes de prisioneiros que seriam levados para o presídio Aníbal Bruno. Notava-se o pavor dos próprios prisioneiros, mesmo os perigosos, em irem pra lá. Disseram que ali onde estávamos era um lugar confortável e pacato, e que não haveria tratamento nem semelhante no outro presídio. As drogas, os assassinatos, agressões, estupros, acontecem continuamente. Também vários outros presos foram soltos para responderem em liberdade. Como me explicaram, ninguém fica preso por assassinato. Somente fica na cadeia se for pensão.

Com a cela um pouco mais calma, um dos prisioneiros resolveu estuprar um dos travestis, que ali estavam para servir aos homens da cela. Aproveitei o espaço extra (tinham somente 30 presos na cela naquele momento) e arrumei um lugar para me deitar e evitar aquela cena grotesca. Ao meu lado alguns prisioneiros fumavam maconha e pediram meus pães para curar a “larica”, o que cedi sem pestanejar. Além de não querer contrariar ninguém, também não estava com fome.

Deitei, mas não por muito tempo. O chão sujo, duro, o fedor da cela, dos gases, do banheiro e as preocupações com minha integridade não me permitiram pregar o olho. Logo que voltou a calmaria da cela, resolvi me levantar. Nisso, aquele senhor que havia espancado a esposa me chamou para conversar. Ele explicou um pouco de como funcionavam as coisas por ali e que não haveriam com o que me preocupar, pois estava sendo cuidado. Um pouco mais tarde descobri que havia uma arma dentro da cela para assegurar que as coisas seguissem “nos conformes”.

Pela manhã serviram canjica (mugunzá para os nordestinos) e pães. Peguei os dois pães conforme orientação e me emprestaram um prato para o mugunzá, que levei a cela. Como não estava com fome, foram repartidos com o pessoal. Continuava preocupado com o tempo que passava e sem sinal de novidades do mundo exterior. Já era manhã de terça-feira e havia trabalho para fazer e um voo para pegar na quarta-feira a noite.

Os “novatos” (comigo incluso) precisaram sair em várias ocasiões ao longo do dia para procedimentos do presídio. O primeiro deles foram as fotos para a ficha prisional. Após fomos encaminhados para uma sala onde aguardamos pela entrevista médica e seguidamente para a assistente social. Lá me foi perguntado porque estava lá e expliquei a história e disse estar preocupado por ainda não estar solto. Passei os telefones dos meus pais pois eram os únicos que sabia de cabeça. Todos os outros estavam em meu celular, mas ninguém poderia consultá-lo.

Uma pessoa ligado a pastoral da igreja católica apareceu na cela para levar suprimentos para os presos – sabão em pedra, sabonete, escova de dentes e aparelho de barbear. Também levou recados dos presos para os familiares, e pedi para que levasse a informação para meus pais de que estava bem e quis saber se havia algum problema para minha saída.

De volta para a cela comecei realmente a ficar ansioso com a questão de ninguém ter aparecido. Já era hora do almoço, onde serviram arroz, feijão e frango. Desta vez insistiram para que eu comece algo e me alertaram que ir para a enfermaria era muito pior do que a cela. Me emprestaram novamente um prato para que eu pegasse um pouco de comida. Peguei não mais que uma pequena tigela de arroz e feijão. Como não havia talheres, resolvi comer com a mão, o que foi uma péssima ideia. O gosto azedo da sujeira das minhas mãos impregnou em minha boca. Resolvi usar somente a boca, e comi da tigela como um cachorro faria da sua comida, apenas com minha linga. Após algum tempo comendo assim, numa atitude muito gentil um prisioneiro me estendeu sua colher para que eu comesse minha comida com ela.

Não havia bebido nada até aquele momento, nem estava muito disposto a isso. A preocupação começou a tomar conta de mim, pois algo deveria ter dado errado. Se com o pagamento da pensão eu deveria ser imediatamente solto, porque ainda não havia saído?

Um novo prisioneiro chegou, todo imundo, fedendo a esgoto e impregnando toda a cela, mais do que o habitual mau cheiro. Imediatamente o surraram e o mandaram tomar banho, coisa que o fez rapidamente. Quando terminou seu banho, perguntaram se ele era mulherzinha. Ele disse que não e então deram uma bela surra nele. Insistiram na pergunta e ele insistiu na resposta. Então levaram de volta para o box do banheiro e fecharam a cortina. Mais uma vez muitas pancadas eram ouvidas por todos os presos, além de gritos abafados daquela pessoa, que parecia bastante jovem.

Quando saiu de lá chorando, perguntaram pra ele se ele era mulherzinha, e ele afirmou chorando que sim. Então o avisaram que era uma das obrigações delas fazerem todo o serviço da cela, e pediram para que a limpassem. Deram-no uma vassoura, um pano e uma garrafa com produto de limpeza e ele começou a fazer o serviço.

A noite voltou a cair. Como poderia ainda não estar liberto??? O que poderia estar havendo? Será que receberam meu recado? Será que meus pais estariam em contato? Será que não haviam conseguido levantar o dinheiro? Cada vez ficava mais calado e apavorado. O fedor, o medo e a humilhação tomaram conta de mim, com minha única roupa toda suja.

De repente chamaram novamente os presos novatos. Achei que pudesse ser o momento da saída, quando venho a descobrir que se tratava de raspar a cabeça de todos os presos. Cada corte em meu cabelo, cada mecha de cabelo que caia, é como se fosse mais um pedaço da minha dignidade indo para o chão, até não sobrar mais nenhuma. Foi nessa hora que caí em prantos.

Alguns presos novos entraram, sendo um travesti muito bonito, que foi disputado na cela para ver quem seria seu dono. Apesar da disputa, logo a cela se acalmou novamente e começamos a conversar uns com os outros. Pude ter uma noção da vida de muitos prisioneiros. A grande maioria estava lá pela segunda ou terceira vez, e uma boa parte havia matado e era usuário de drogas. Alguns eram apenas traficantes e uma minoria estava lá por outras razões. Havia um senhor que, assim como eu, estava lá por pensão. Um caso que me chamou a atenção foi um senhor todo machucado que alegou ter apanhado da esposa de vassoura e ela, além de ter batido, o levou preso pela Lei Maria da Penha. Outro, numa alegação semelhante, disse ter entrado num embate verbal onde somente ele acabou preso, mesmo que ambos tenham trocado farpas.

Dali a pouco fui chamado novamente para ser encaminhado para o presídio. Nisso uma pessoa me chamou a parte das demais para uma sala e se pôs a conversar. Minha acusação era apenas de pensão e ele disse que iria me levar para a ala dos trabalhadores (prisioneiros que optaram por trabalhar) ao invés do presídio. Ele ainda comentou que não poderia fazer o mesmo pela outra pessoa pois contava uma acusação de abuso sexual. Apesar disso ele o poupou ao não partilhar esta informação com os outros presos, possivelmente por acreditar que tenha sido uma falsa alegação como tantas que acontecem por aí.

Na cela haviam me orientado para pedir para aguardar por lá, pois dependendo para onde me mandassem seria muito pior do que ali. No entanto, quando voltei para lá, o “paulista” me disse que o lugar que me encaminharam seria muito tranquilo. Ele me pediu dinheiro e dei o que tinha, os R$ 14,00, e segui para a “ala conjugal” como chamam aquele setor que compreendia a cela especial, a ala dos trabalhadores e a área de visita conjugal. Quando cheguei, me senti num verdadeiro paraíso. Pessoas em geral muito educadas (dado o grau de instrução) que tinham uma “boa índole”. Foi de lá que o paulista saiu antes de ir pra cela dos tarados. Ele trabalhava na cozinha e resolveu literalmente cozinhar um detento enquanto dormia num dos corredores. Prontamente me arrumaram um pequeno colchonete para dormir no corredor. Achei aquilo incrível! Foi a primeira noite que consegui dormir ali.

Logo pela manhã serviram o café com pão. Não quis comer e um dos presos me alertou que deveria começar a entrar na linha, pois se decidissem me levar para a enfermaria, seria fora daquela unidade, e que o lugar era muito pior que ali. Prometi que comeria algo no almoço.

O local não era tão ruim. Havia um terreno para o pessoal jogar bola, área para exercícios e até mesa de sinuca (pago) para brincar. O pessoal havia improvisado um jogo de damas por ali também. No entanto as quarta-feiras eram especiais ali, pois eram dias de visita. Poucos antes das visitas chegarem, foram informadas as regras de comportamento. Não poderíamos olhar para as visitas e muito menos conversar com elas. Exceto para aqueles que as visitas eram destinadas, não deveríamos nos aproximar delas e, caso se aproximassem de nós, deveríamos imediatamente e discretamente ir para outro local.

Estava feliz achando que teria imediatamente uma visita. Aquela manhã fiquei bastante empolgado, pois teria uma notícia do mundo externo e possivelmente entenderia o que estava me impedindo de sair. Arrumaria uma forma de resolver e estaria liberto antes do horário do meu voo naquela noite, que era de suma importância para meu trabalho.

Fiquei passando o tempo junto aos estelionatários. Eram em geral pessoas cultas com quem valia a pena a conversa. Alguns homicidas também. Haviam muitos casos de injustiças ali no presídio, reconhecido prontamente pelos presos. Pessoas levaram a culpa de outras. ou não tinham dinheiro para se defenderem. Me convidaram um pouco depois para falar com o “pastor”, que queria me conhecer. Tinha chegado a notícia da minha viagem de bicicleta para ele! E olha que não havia comentado isso dentro da ala conjugal.

Outros presos se juntaram a conversa e logo haviam 6 deles acompanhando as histórias. Logo o almoço foi servido, mas pedi para comer um pão no lugar, pois não estava com estômago para almoçar. Minha maior preocupação era o trabalho, pois não poderia perder em hipótese alguma meu bilhete aéreo. Levei tempo fechando este contrato e se perdesse o voo certamente perderia este serviço. Começava realmente a me desesperar com isso. Comecei a andar freneticamente pela cadeia de um lado para o outro, a ponto de um policial perguntar pra outro preso se eu era doido. Um pastor que fazia proselitismo me chamou para orar, quando lhe respondi que não era oração que me faltava, mas um telefone.

Me encaminharam para a psicóloga para conversar. Ali pude recontar minha situação e falar novamente do telefone. A assistente social do presídio apareceu dizendo que ela chegou a ligar no telefone que falei pela manhã, mas não conseguiu falar com ninguém. Somente poderiam tentar novamente uma ligação pela parte da noite, mas que certamente não sairia de lá hoje.

Chorei. Chorei muito por saber o tamanho do problema que teria por perder o bilhete aéreo, o trabalho e a oportunidade de recuperar um pouco da situação financeira que me encontro. Voltei para o pavilhão de cabeça baixa, não somente por ordem, mas pelo sentimento de miséria. Oportunidades ter uma vida um pouco melhor ou para meu filho se vão de maneira tão simples e vil.

Logo após voltar foi feita a contagem de prisioneiros e então assistir o ocaso. Minha noite foi de pura tristeza. Cheguei a pensar em desistir de vez de ficar com meu filho, pois é muito difícil lutar contra a “justiça” do nosso país.

De cabeça baixa vi se passando os últimos momentos que poderia pegar o voo. Quando o último fio de esperança se foi, me dirigi a área de exercícios e comecei a pedalar. Era uma forma de me revigorar as esperanças. Foi como se relembrasse minha viagem e os percalços do caminho. A perseverança dia a dia é o que me permitiu ter o contato mínimo que tenho hoje com meu filho. Precisava perseverar.

Fui até o colchonete no corredor e fui me deitar. Era cedo, ainda nem haviam servido o jantar, mas não queria esperar. Além de não ter fome, o sono ajuda a curar a tristeza. De repente chamam pelo meu nome. Um homem me diz que devo sair do presídio. Fico simplesmente congelado, sem nenhuma ação. “Vamos agora!” insiste ele. Caminho sem muita convicção, quando se aproximam alguns prisioneiros que conheci e me cumprimentam, abraçam e desejam boa sorte.

Meu advogado, Dr. Virgínio Batista, e uma amiga, me aguardavam do lado presídio. Após as ultimas formalidades e me dispensaram da prisão. Foi quando pude descobrir o que aconteceu “do lado de fora” enquanto estive preso.

Assim que foi determinado minha detenção, minha amiga providenciou do dinheiro dela imediatamente o valor definido. O problema era que queriam não somente o valor da pensão que constava na execução, nem somente as últimas três parcelas como é o entendimento costumás, mas exigiam todas as parcelas atrasadas e mais um extra para o advogado a serem pagas de uma vez. Ela entrou em contato com meus pais que conseguiram levantar a quantia para fazer o pagamento. Mesmo assim foram criados vários empecilhos para que a justiça pudesse emitir um alvará de soltura, que somente puderam fazê-lo na quarta-feira. Mesmo chegando as 14h00 no presídio, somente pude sair após as 18h00, sabe-se lá por qual razão.

A noite foi de muito choro. Simplesmente não tenho como ressarcir minha família no momento pois não tenho de onde tirar este dinheiro. A justiça pouco se importa com a situação e a pensão mais uma vez não é uma ferramenta para suprir o necessário e sim uma arma de vingança e pecúlio. Meu filho precisa de fraldas, não de um carro.

No dia seguinte, comigo já em liberdade, ligaram do presídio para meus pais para avisá-los que estava lá.