terça-feira, 23 de novembro de 2010

Dor

O recomeço é sempre difícil. Minha vida pregressa foi simplesmente descartada. A saudade de todos meus amigos e familiares já é evidente, bem como as dificuldades financeiras por conta de aluguel e tantos outros novos custos, para os quais ainda não tenho uma receita para suprir.

Hoje comemorei meus 31 anos relembrando quantas dificuldades os últimos tempos me deu e as tristezas que me acompanham desde então. Entristeço pelos prejuízos ao meu filho, tanto financeiros quanto emocionais.

Aqui, sozinho, meu único consolo é ver meu filho diariamente, oportunidade dada na última audiência. Apesar das severas regras impostas, finalmente consegui iniciar a reconquista do meu filho, que já começa a lembrar de meu rosto a cada encontro.

Resolvi silenciar-me um pouco perante a imprensa para que as próximas etapas do processo se apresentem. Enquanto isso, resta-me esperar e continuar visitando-o diariamenrte.

sábado, 13 de novembro de 2010

Repercurssão

Até o momento o esforço valeu a pena. Dois artigos foram publicados, além de uma reportagem na TV Tribuna que estou tentando conseguir uma cópia. Para qualquer um que me identifico como "o cara que veio pedalando", imediatamente sabem quem sou. Falta agora formalizar meu vínculo com uma associação de pais para que tenhamos em Recife uma estrutura de apoio a pais na mesma situação que a minha.

Por sorte, e graças a solidariedade do pessoal daqui (obrigado Enio e família), estou hospedado próximo a uma feira literária, a Fliporto. Darei andamento a construção de livros contando a história. Um primeiro volume destinado aos pais contando o drama, o processo, os erros e acertos. Num segundo volume, destinado aos amantes de viagem, sobre como foi toda a jornada, com muitas informações que tiveram que ser omitidas do site para que não ficasse extenso, além das muitas fotos do caminho.

Não tenho experiência em escrever, mas também não tinha em pedalar. Vamos ver o que irá acontecer. Minha audiência também será em alguns dias e contarei qual será o resultado.


Fim da viagem

Entrar em Pernambuco foi tranquilo. Com a ansiedade por findar a viagem, segui sem muitas paradas rumo a próxima parada. Tive apenas o contratempo de duas trocas de pneu, graças a uma câmara furada trocada por outra já furada que eu havia guardado.

Porto de Galinhas
A parada foi em Sirinhaém, numa pequena pousada no centro da cidade. Com a proximidade do destino final, entrei em contato com um amigo que acompanha a lista desde o início, o Enio, que é ciclista em Recife. Ele ficou de me ajudar na confecção de uma faixa para exibir no fórum, bem como acompanhar-me até lá.

De Sirinhaém havia muito tempo livre para a chegada em Recife, programada para o próximo dia. Para ocupar o tempo fiz um pequeno desvio para Porto de Galinhas, uns 40km de desvio no meu percurso. Chegando lá dei um pequeno passeio na cidade, tomei um caldinho de feijão e segui viagem.

Durante o trajeto resolvi cortar caminho pelos canaviais, o que foi uma péssima idéia. A quantidade de moscas ali era medonha! Além disso, havia uma ponte quebrada no caminho que me fez voltar praticamente todo o caminho. Meu percurso total no dia foi de 96km, parando dentro da região metropolitana de Recife.
Ponte quebrada

Uma vez lá, tive a agradável surpresa de que o Enio iria se encontrar comigo por lá, o que aconteceu mais tarde. Tivemos uma boa conversa, falamos sobre a viagem e planejamos o dia seguinte. Logo pelas 09h00 ele batia na porta da pousada para fazermos o último trecho do percurso.
Seguimos com ele liderando até uma praça em Boa Viagem, já dentro de Recife. Foi nosso primeiro ponto de parada, onde encontramos o pessoal da TV Tribuna - Rede Record. Tivemos uma longa conversa com a equipe e gastamos 1h30 fazendo a matéria. De lá, partimos para o último momento do trajeto - a chegada ao fórum Joana Bezerra.

Tive muita satisfação em finalmente chegar ao fim da linha. Demos a volta no fórum e tiramos várias fotos, além de darmos duas entrevistas aos principais jornais da cidade - Diário de Pernambuco e Folha de Pernambuco.
Chegada no fórum

A matéria na televisão já foi publicada, mas não consegui ter acesso a uma gravação para coloca-la no blog. Tentarei na própria emissora amanhã. Amanhã também haverá a publicação dos jornais, que tentarei escanea-los e publica-los.

Agradeço ao apoio e carinho de todos. Os muitos que me ofereceram carona pra voltar, caso não conseguisse (e foram realmente muitos!), as pessoas que me foram gentis no caminho, as que me socorreram nas horas de maior necessidade. O pessoal do "Pais por Justiça" e da "PariciPais" exerceram funções importantíssimas em toda esta jornada. A viagem, além do protesto, foi uma verdadeira lição de vida. Aprendi o que é ter que mendigar, passar fome e sede, o que é ter medo, o que é arriscar a própria vida, de sentir o lado bom e ruim da completa solidão. Tive muitas decepções e muitos momentos de alegria, mas o principal, tenho uma demonstração para meu filho de que me importo com ele. Caso ele não venha a conhecer o pai pelos próximos anos, saberá que estou presente ao lado dele, de corpo e alma, e que terá sempre meu amor.

A parte fácil da jornada está concluída. Agora vem a parte difícil. Terei a nova audiência de conciliação no dia 17 e de lá saberei quais as próximas medidas a tomar. Espero que desta vez me permitam reestabelecer o vínculo com meu filho.
Também recomeço minha vida em Recife. Graças a generosidade da família do Enio, me conseguiram dois dias de pousada por aqui. Terei que aproveitar os próximos dias para levantar uma fonte de renda por aqui e conseguir um lugar mais definitivo pra ficar.

Obrigado a todos que partilharam estes dias de viagem. Convido-os agora a partilhar da luta pelo meu filho, pois esta batalha está somente no início.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Chegando em Pernambuco

A saída da Ilha da Crôa se deu pelo meu lugar preferido - a beira do mar. Tanto é o caminho mais curto quanto o mais bonito e mais prazeroso. Nesta região em especial pude ver cenários incomuns, tal como um bar num lugar de acesso extremamente difícil, no meio do nada. O mais curioso era que estavam com clientela, que vieram de carro pela areia da praia.

Adiante pude ver outra cena bizarra - um veículo vindo a tona na praia, fazendo gracinhas, começou a "saltar" nas ondulações da areia cada vez mais alto, até que bateu de frente com uma pedra. Um pedaço do farol e do parachoque ficaram no caminho e ele imediatamente reduziu a velocidade e seguiu de mansinho dali em diante.

Mais a frente ainda, um pequeno iate com umas 40 pessoas passeando por outro ponto deserto da praia. Estava achando muito agitado estes trechos "desertos". O maior presente veio adiante: formações ímpares na areia. O rastro de veículos parava ali, pois daquele trecho em diante era intransponível, exceto para que estivesse a pé ou de bicicleta! De início achei que se tratava de formações rochosas, pois eram extremamente rígidas. Com o caminhar pude identificar melhor.

Estas formações nada mais são que areia! Estavam extremamente endurecidas, mas em alguns poucos pontos era possível encontrar trechos menos rígidos. Foi um cenário único! Cada passo que dava via milhares de pequenos bichinhos correndo para todos os lados. Cada poça d'agua guardava uma supresa diferente, como peixes ou alguns crustáceos. Não era incomum encontrar um carangueijo passeando por lá. Além disso, tapetes sem fim de algas cobriam alguns pontos. Também haviam algumas árvores no meio do caminho.

Apesar da beleza do caminho, torcia para que logo terminasse. Transpor este trecho era muito penoso. Enfim, não muito depois, de volta as longas prais.

Segui até o final da linha, na foz de outro rio. Como da vez anterior, precisava localizar algum ponto de passagem (se houvesse). Não muito distante, vários barcos pescando que poderiam me auxiliar na travessia. Conforme margeei o rio, milhares de pequenos caranguejos correndo para todos os lados. Foi uma visão bem interessante.
Saulo
 

A travessia foi tranquila e me custou um real. De lá, mais um pouco de pedal, desta vez na estrada paralela a orla. Logo no início da estrada encontrei um jovem chamado Saulo, que me acompanhou por alguns trechos. Conversamos ao longo de caminho e ele me ofereceu um litro de suco que estava com ele. Parei no mercadinho de sua mãe e ficamos conversando enquanto matava a sede. Expliquei toda a história até acabar com a última gota da caixinha. De lá seguimos juntos os próximos 10km. Parece que acompanhado a pedalada rende muito mais.

Nos despedimos e fui em frente, adminirando cada vista que a natureza me apresentava no caminho. Que região linda!

Meu descanso foi em Maragogi/AL, praticamente a última cidade de Alagoas. Fiquei numa pousada ainda em fase de acabamento, com uma especial fartura nas refeições. Noite agitada, despertar no raiar do dia. Estou ansioso pelo fim da viagem e não quero perder tempo.

Pela manhã vários cumprimentos dos transeuntes, mas um rendimento um tanto lento. Pela hora do almoço avisto a divisa do estado.



terça-feira, 9 de novembro de 2010

Atravessando Alagoas

Rio São Francisco
A saída da Ilha das Flores foi a todo vapor, sustentando uma excelente velocidade em uma pista quase plana. Depois de uma pequena travessia de balsa, passei pela região de Coruripe/AL. Minha parada foi na cidade de Jequiá da Praia. Fiz 92km neste dia.

Um pequeno descanso em uma pousada barata, mais uma sequência de viagem. Como minha intenção de chegada era dia 16, estava com os dias folgados para chegar a Recife, permitindo certos abusos com o tempo. Quando avistei o mar e vi uma trilha de acesso, não exitei em entrar e explorar. Cheguei em Lagoa Azeda. Lá era um ponto sem saída, exceto pela areia da praia. Como a maré ainda estava favorável, prossegui por ela.

O lugar tinha uma estrutura peculiar, com altos montes margeando a praia, com vastas áreas erodidas. Meu caminho pela areia rendeu bastante, exceto pelo final, quando a maré subiu. Gastei metade do tempo de travessia para transpor os últimos 3km de praia, até a Praia do Gunga. Fiquei espantado com o movimento e aparentemente o espanto foi recíproco, com um ciclista saindo no meio do nada em meio a multidão.

Por todo caminho belas paisagens me acompanharam. Meu descanso foi na antiga capital de Alagoas, Marechal Deodoro, num ponto chamado "Praia do Francês". Apesar da distância pequena, estava tranquilo com o prazo.

Havia programado para o dia posterior um descanso em Maceió. A pedalada até lá foi tranquila, exceto pelos quilômetros finais que não havia acostamento e o trânsito estava intenso.

Ao adentrar na cidade, encontro a equipe do jornal Gazeta de Alagoas. É claro que imediatamente eu parei ao lado do carro deles e contei minha história. Fui escoltado até a redação com um carro da imprensa. Foi engraçada a reação das pessoas a minha volta, olhando curiosas em saber o que estava acontecendo.

Maceió/AL
Fiz uma pequena entrevista, tirei umas 100000 fotos e pus o pé na estrada. Consegui combinar com um colega ciclista de Recife para me escoltar nos quilômetros finais, e ele sugeriu dia 12. Essa mudança de planos me fez apertar o passo, pois agora o prazo estava apertado.

Aproveitei e marquei esta data como a oficial pra chegada. Desta forma fica mais fácil planejar.

Em passos fortes segui rumo a Ilha do Crôa, onde foi meu ponto de descanso. Por muito pouco não fiquei sem janta, pois o último restaurante aberto estava arrumando as mesas pra fechar. Os restaurantes do lugar fecham antes do jantar.

Ilha das Flores

Fim da linha na praia
Pedalar pela areia é muito prazeroso. Você tem a sensação de completa solidão, tendo como únicos sons o bater das ondas e o cantar dos pássaros. A visão é exuberante. Exceto por alguns pescadores, só havia areia a frente.

Por vários quilômetros este foi o cenário que me acompanhou. Bem... foi assim até o final da linha. Não havia visto direito no mapa nem fui informado que, em determinado momento, este caminho seria interrompido. Sem saber se se tratava de um rio ou uma curva, tive que começar a explorar a região. Fazer isso na areia fofa é extremamente desgastante.

Gradualmente fui margeando a região e avistando casas do outro lado do rio. Estava muito propenso a desmontar a bicicleta e atravessa-la a nado, mas apenas faria isso se tivesse esgotado a região próxima. Depois de quase duas horas explorando a região, avistei ao horizonte alguns coqueiros que matariam minha sede, pois a água estava se acabando e precisaria assegurar minha hidratação. Com muito esforço fui até o lugar, quando dei a sorte de avistar alguns pescadores. Não pensei duas vezes e segui atrás deles para pegar a informação da saída, que estava exatamente ao nosso lado. Foi um sufoco.

Pela estrada de terra pude encontrar um pequeno bar onde me reabasteci e prossegui rumo a uma balsa para atravessar o rio São Francisco. Logo neste bar um carro com olhares curiosos passou por mim. Pouco depois eu o reencontrei e pedi informações aos ocupantes. Eles me orientaram por onde prosseguir e assim o fiz.

Caminho rumo a Ilha das Flores
Pequenas comunidades pelo caminho, uma após a outra, até que reencontro o pessoal que me deu a orientação. Se propuseram a liderar o caminho pra mim e aguardar nos pontos chaves. É ótimo ter alguém nos orientando! Pouco depois ele parou e quis conversar um pouco. Contei toda minha história pra ele e prontamente ofereceu hospedagem em sua casa para a noite, em Ilha das Flores. Eu inicialmente declinei e seguimos com a escolta, mas depois fui percebendo que estava ficando tarde - já eram umas 16h00 - e não chegaria muito longe neste dia. Avisei-o e mudamos o trajeto para Ilha das Flores, 8km fora do meu destino.

Ele me recebeu muito bem e me apresentou a esposa e a filha de 2 anos (idade do meu filho) que não suportava ficar 1 minuto longe do pai. Para onde ele ia a menina ia junto e chorava se não fosse. Fiquei emocionado em pensar que era assim que encontraria meu filho em Recife.

Junior e família
Mais tarde ele falou com alguns amigos na cidade pedindo doações pela causa! Fiquei super constrangido, mas minha situação atual não me permite falar não e aceitei o dinheiro. Foi uma ajuda significativa.

Durante a noite não consegui dormir por vários pesadelos envolvendo o Francisco e o quão crescido ele já está. Fui excluído de muitos momentos importantes da vida dele.

De manhã o Junior levantou comigo as 05h00 e ME PREPAROU CAFÉ DA MANHÃ! Foi uma atenção muito especial e pude seguir viagem rumo a Alagoas com ânimo renovado!


domingo, 7 de novembro de 2010

Saindo de Sergipe

Posto Rodoviário em Aracajú
Comecei bem cedo meu dia, especialmente por estar de favor, queria ficar o menor tempo possível na pousada. Tomei meu café e segui estrada. A pedalada até aracajú foi bem tranquila, até que encontrei um posto rodoviário para pedir um pouco d'agua.

Ao chegar lá, me perguntaram de onde estava vindo e um pouco de toda a situação. Me receberam no lugar muitíssimo bem e chamaram a TV Record para informa-los do episódio.
 
A equipe da TV Atalaia chegou poucos minutos depois e fizeram uma reportagem ali mesmo no posto rodoviário.



Mais interessante que a reportagem foi a própria conversa que tivemos no posto, junto a equipe da TV e aos policiais. Praticamente todos nós passávamos por situações semelhantes. Uma das pessoas perdeu a guarda da filha pra mãe. Quando ela morreu, perdeu a guarda pra tia! Outros tiveram situações semelhantes e ninguém detém a guarda dos filhos!

Após concluída a reportagem, ainda fiquei um pouco mais no posto, pois me convidaram pra almoçar. Realmente era um pessoal muito gentil. Segui viagem, mas já um pouco tarde. Iria ficar por Aracajú mesmo, tirar dinheiro no banco e arrumar minha bicicleta que havia quebrado alguns raios.

Depois de encontrar um banco e aguentar os olhares estranhos pra uma pessoa fantasiada de ciclista dentro de uma agência, segui para uma bicicletaria logo adiante para arrumar os pequenos defeitos e trocar meu óculos que tinha quebrado de vez.
Ciclista Maurílio

Os alforjes da bicicleta chamam a atenção, pois foi a primeira coisa que perguntaram quando entrei: "de onde você vem?". Contei minha história e uma das pessoas que estavam na loja se prontificou a me oferecer hospedagem! Era uma pessoa muito atenciosa e que rendeu uma longa conversa, tanto por ele ser cicilista como por ele adorar estudar. A noite aproveitei para ir ao Shopping da cidade comprar algumas bolachas e ver se achava uma bolsa de água para substituir a minha que estava furada.

Pela manhã ele me levou a uma padaria próxima e tomamos um ótimo café da manhã e que ele insistiu em pagar. Minha viagem prosseguiu sem demora e pouco depois estava atravessando a cidade. Acabei tendo que interromper a pedalada para dar outra entrevista, desta vez para a Revista Alfa, da editora Abril. Estão escrevendo uma matéria sobre guarda de filhos.

Gilton e colega em Pirambu/SE
A viagem em si foi bem tranquila, com poucos trechos complicados. Havia comércios por perto e não foi muito difícil encontrar suprimentos. Em um dos locais que parei para comprar bolacha passei alguns momentos conversando sobre a história do meu filho. O pessoal que estava lá me encontrou vários quilômetros depois e me convidaram pra almoçar em Pirambu, o que prontamente aceitei. Fui não por causa do almoço, pois não almoço, mas pela companhia. Pude conversar um pouco com eles antes de seguir viagem.

Para sair de lá acabei me complicando um pouco. A maré estava cheia e se manteria assim até umas 21h00. Como meu farol não está funcionando desde Porto Seguro, a pedalada noturna estava fora de cogitação. Acabei procurando alguma trilha para seguir viagem e acabei gastando quase duas horas para descobrir para onde ir. A rota era sentido Lagoa Redonda.

Segui por vários quilômetros em estrada de terra até chegar na cidade. Foi uma surpresa! O lugarejo reune numa só região praias, lagos, cachoeiras e dunas. Pude fazer um pequeno tour na região ao finalzinho do dia. Valeu a pena.

Fiquei a noite em uma pousada bem simples em meio a natureza. Fui acordado duas vezes a noite, uma vez com uma barata andando sobre mim e outra com um bicho que certamente era o cruzamento entre um besouro e um avestruz. Mas valeu a pena. O lugar era bem organizado e os proprietários muito atenciosos. Tive um bom jantar e café da manhã. Minha partida foi cedo, umas 09h30.

Aproveitei a maré baixa e segui novamente pela areia da praia. Estou começando a pegar o jeito!


sábado, 6 de novembro de 2010

Apuros em Sergipe

Costa Azul
Manhã de empolgação, bem disposto pra pedalar e cruzar mais um estado. Infelizmente um problema que há dias estava incomodando e que realmente chegou a uma situação crítica foi a questão do dinheiro. Não haviam caixas do Banco Itaú fazia alguns dias e o dinheiro acabou. Fiquei sem recursos financeiros para nada além de uma refeição e não sabia mais o que fazer. O jeito foi continuar a viagem e descobrir o que faria depois.

Todo o caminho pela rodovia foi monótono, com algumas fortes subidas e sem nada pelo caminho. Meu objetivo era chegar a Mangue Seco, mas as informações eram contraditórias (pra variar). Em Conde disseram-me que havia um acesso direto. Já num posto rodoviário me foi informado que não era possível acessar a cidade e que meu trajeto deveria ser uns 100km maior do que eu havia planejado. Mais uma vez meu GPS me pregou uma peça: Em certa altura da estrada havia uma saída que seguia diretamente para o nome "Mangue Seco". Quando vi a saída, não tive dúvidas! O que não imaginava era que, na verdade, o caminho era para Costa Azul.

Verlon (meu benfeitor)
Cerca de 15km separavam a saída da rodovia até a cidade, onde recebi a informação que se tratava de um fim de linha. Não haviam estradas ligando o lugar a Mangue Seco, que ficava 35km de distância. Pra piorar, meu dinheiro estava tão crítico que nem mesmo água poderia me dar o luxo de comprar. Nestas horas a humanidade as vezes nos surpreende.

Parei em um restaurante a beira-mar pra pegar informações e acabei contando um pouco de toda a história. Imediatamente o pessoal de lá me ofereceu uma farta e deliciosa refeição, com direito a refrigerante e boa companhia. Foram todos muito gentis comigo, além de me orientarem uma alternativa para alcançar o Mangue Seco - 35km de pedalada na praia! Dizem que errar é humano e persistir no erro, burrice. Eu persisti. Segui as orientações do Sr. Verlon e não é que desta vez a bicicleta se sustentou na areia? Foi uma experiência mágica estar só, pedalando a 15km/h e ouvindo apenas o mar.


A chegada em Mangue Seco foi prazerosa. O local foi usado nas filmagens de Tieta do Agreste na Globo e é um lugar simplesmente lindo! Pra melhorar, tanto a pousada quanto o restaurante de lá aceitavam cartão de débito! Estava salvo! Ou quase.... a embarcação que faria a travessia era somente em dinheiro, o qual não dispunha. Pensaria no outro dia o que faria.
Mangue Seco/BA

Pela manhã seguinte me dirigi para a casa onde serviam o café da manhã e tive o prazer de encontrar uma família muito simpática e inteligente. Tivemos uma grande conversa e me informaram que o rumo que deveria tomar era o da praia do Saco, o qual eles seguiriam as 11h00 e me ofereceram carona. Estava salvo! Ou quase....

Pelas 10h00 fui até o local do encontro, para ter certeza que não perderia esta ajuda. O ponto era a beira do rio, onde fui abordado por um barqueiro. Ele me perguntou onde eu ia e ele se propôs a me deixar lá por R$ 5,00 (o que tinha na carteira) já que ele deveria fazer a travessia de qualquer maneira. Enfim, achei que tinha sido um negocião, mas vir a descobrir mais a frente que não.

O lugar que ele havia me deixado se chamava Pontal, mas não sabia deste detalhe até este momento. Pedi informações de como prosseguir para Aracajú e os moradores me deram as orientações. Pedalei por algumas horas até chegar numa cidade chamada Terra Caída, onde deveria pegar uma balsa e fazer a travessia.
Vanderlei em Terra Caída/SE

Lá encontrei um rapaz muito bacana que se prontificou a pagar um refrigerante e a balsa para mim (ele não sabia da minha dificuldade). A gentileza foi apenas pelo entusiasmo de encontrar um ciclista de tão longe. Ele me salvou da dificuldade que estava sem saber.

Durante o trajeto com a balsa, avisto a mesma ponte em construção que era visívil de Mangue Seco! Após horas de viagem, ainda estava praticamente no mesmo lugar! Dei uma volta enorme, ainda a uns 10km da praia do Saco!


Depois de um dia praticamente perdido, o jeito foi continuar pedalando até onde desse, no caso, Caueira. Parei quando já estava anoitecendo na única pousada da região e que não aceitava cartão! Tive que contar com a generosidade do proprietário em me receber no local e, principalmente, com a generosidade de um cliente de lá que me deu dinheiro para comprar comida.

No dia seguinte estaria em Aracajú. Lá, tinha certeza, haveria um banco Itaú para que eu pudesse resolver minha situação.

domingo, 31 de outubro de 2010

Adeus Bahia

Valença/BA
Meu dia começou bem cedo em Camamu. Tão logo tomei meu café, arrumei as coisas e fui embora. Pela estrada, pouca dificuldade e muitas pequenas vilas. Não me faltou água nem pontos de parada, o que tornou este dia particularmente tranquilo. Transpus Igrapiúna, Ituberá, Nilo Peçanha, Taperoá até alcançar Valença, onde pude repousar em uma pousada bem barata, mas muito boa.

Mais um dia, mais uma pedalada em ritmo forte. Queria logo chegar em Salvador e dar uma descansada. Desta vez não haviam tantos locais pelo caminho, passando unicamente pela cidade de Nazaré. Aliás, este dia foi bem cansativo, apenas sendo empurrado pela nuvens que davam sinal de uma forte chuva. Conforme a pedalada prosseguia, mais ventos e trovões e mais rápido avançava até a próxima localidade, mas não rápido suficiente. A chuva me alcansou e estava realmente forte. Meus últimos 15km de pedalada foram debaixo de água e muitos ventos até que cheguei em um pequeno vilarejo chamado Vera Cruz. Fui muito bem recebido no lugar com um bom jantar e uma boa cama.

Salvador/BA
Acordei com um ânimo renovado, tanto por causa do bom tempo quanto pelo destino. Finalmente chegaria a Salvador! Saí cedo, como de costume, e rumei ao porto. Não tardou a cumprir os 20km restantes para pegar a balsa e atravessar a baia de todos os anjos. Foi uma travessia longa e a chegada bem complicada. 

Como toda metrópole, tive que enfrentar um trânsito caótico, longas distâncias e me perder pelas ruas. Como já era início da tarde e não iria muito longe, resolvi tirar o resto do dia pra mim e continuar no dia seguinte. Fui rumo ao Pelourinho para tirar algumas fotos e conhecer os pontos principais. Tirei várias fotos e segui rumo ao Shopping Salvador, que ficava rumo a saída da cidade. Me avisaram que na região, próxima a rodoviária, havia muitos hotéis baratos. 

Enfim, aproveitei a noite para ir ao cinema assistir Tropa de Elite 2 (muito bom!) e comer um pouco melhor que o de costume. Tomei um belo Milk-Shake e fui pro hotel me preparar pro próximo dia.
Rai e Nicéia

Minha saída de Salvador já tinha destino certo, Camaçari, mais precisamente na praia de Guarajuba, onde mora um amigo. O trecho foi longo e com muitos altos e baixos pela estrada do Coco. Mas havia um bom acostamento e muitos pontos de reabastecimento pelo caminho, o que tornou o trecho não tão difícil. Cheguei ao meu destino no final do dia, onde fui muito bem recebido.

Banho quente, cama arrumada, roupa lavada, bom jantar, belo café da manhã e uma excelente companhia. Não há coisa melhor! Pela manhã fizemos um passeio até a praia da Torre e saí quase 12h00. Antes tarde do que nunca!

Turma no Mirante do Sauípe
O próximo trecho foi pela Linha Verde, no município de Mata de São João. Mais uma vez muitos altos e baixos para dificultar, mas sempre regado com muita água de coco, que havia em fartura pelo caminho. Num dos pontos, próximo ao Mirante do Sauípe, encontrei um pessoal simpático que me prendeu em uma longa conversa sobre vida, política e família. Acabei gastando quase 1h, mas valeu cada minuto.

Meu descanso foi em Subaúma, cerca de 8km pra fora da minha rota. Não havia outras boas opções no caminho e, portanto, acabei desviando um pouco meu rumo. Valeu a pena. Lugarzinho aconchegante, pude gozar de um bom repouso pra seguir no próximo dia.
Conde/BA
Infelizmente nem todos os dias se seguem com a mesma disposição. Acordei me sentindo um pouco mal e cansado e praticamente empurrei a bicicleta por todo o percurso. Não tinha fôlego nem disposição, com uma vontade imensa de parar no primeiro canto e dormir um pouco. Cada passo foi com muito sacrifício e meu dia foi muito difícil. Parei em Conde, não mais que 30km da divisa do estado com Sergipe. Amanhã darei adeus a Bahia.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Costa do Cacau e Dendê

Caminho para Praia - Canavieiras
Foi com pesar que deixei Canavieiras. Uma cidade linda e que certamente voltarei. Como saí muito tarde, a jornada foi pouco produtiva, ainda mais com a série de subidas e descidas que enfrentei. Não consegui seguir além de Una, onde se encontra a ilha de Comandatuba. Como não daria tempo de chegar na cidade seguinte, fiz um desvio de 6km e fui conhecer a tão falada ilha.

Confesso que fiquei muito decepcionado com o que vi. A ilha tem basicamente o hotel de luxo - R$ 1500,00 a diária em baixa temporada - e só. Tive que pegar uma balsa para chegar na ilha e fiquei confinado a ala pobre, que é um bar que fica ao lado do hotel. Pedi um caldinho de feijão e uma cachaça e fiquei olhando as ondas do mar por uns minutos. A vista é muito bonita, mas tem pouco o que se fazer por lá.

Comandatuba
Terminado o pequeno momento de descanso, ainda dei uma volta na ilha e fui até o hotel enquanto a balsa não vinha me buscar.

Por causa do meu pequeno passeio na ilha, pude voltar apenas as 16h30 em função do horário da balsa. Meu trajeto restante até Una se deu no anoitecer. Cheguei por lá e fui procurar um orelhão pra ligar e não achei nenhum operando. É um problema bem recorrente na Bahia, mas compensado pela gentileza dos moradores. Prontamente providenciaram um telefone para que eu pudesse ligar. De lá fiz um bom jantar e segui para uma lanchonete para alimentar meu vício assim que entrei na Bahia: suco de cacau gelado. Tomei 3 jarras de 1L após o jantar! As moças da padaria já estavam olhando assustadas!

Luar de Una
Na pousada, pela manhã, tive uma longa conversa com as simpáticas moças que cuidavam no local. Discutimos os casos que as mães impedem os pais de terem contato, e também dos pais que optam para não ter qualquer relacionamento com os filhos. Foi uma longa conversa que consumiu algumas preciosas horas de pedalada, mas que valeu a pena.

O próximo rumo foi Ilhéus. Infelizmente as distâncias entre as cidades me impuseram um ritmo complicado. Eram longas demais para fazer dois trechos em um só dia, mas curtas o bastante para me deixarem com muito tempo livre. De certa forma foi bom, pois pude fazer algum turismo e não apenas rápidas passagens pelos lugares. O trecho foi bem tranquilo, apesar das várias subidas, e pude chegar rapidamente em Olivença e, depois, em Ilhéus. Caminhei calmamente pela cidade, com o objetivo de encontrar a última pousada, já na saída da cidade. Encontrei uma pousada boa e barata, onde o casal proprietário do lugar me contou a história da filha deles  que fez o caminho de Santiago de Compostela de bicicleta.
Praia do Cristo - Ilhéus/BA

Meu jantar foi pizza, pois era a única opção na redondeza. O jantar pobre foi recompensado pelo café da manhã. Sendo eu o único hospede, os donos, assim que viram eu me levantando, foram correndo preparar o café, que já estava ajeitado apenas esperando eu dar o "ar da graça". Fizeram omelete, banana assada, suco, tudo quentinho e fresquinho. Foi um dos melhores cafés que tive até o momento, especialmente pela atenção que me deram.

Com a barriga cheia, segui viagem por uma bela ciclovia que ia até a Lagoa Dourada, que não cheguei a conhecer. Foram 32km de perfeita planície, que fiz em menos de 2hs tranquilhamente. A empolgação durou até ver o nome da próxima cidade: Serra Grande. A partir da serra, desci da bicicleta e fui empurrando por praticamente  todas as subidas de todo o resto do trecho. Somado ao sol escaldante, foi realmente um trajeto difícil. É claro que toda a dificuldade tem sua recompensa.

Mirante II - Serra Grande/BA
Há dois mirantes em Serra Grande, o primeiro logo no início da subida. A visão era magnífica, conseguia ver toda a praia embaixo e uma grande parte da vegetação. Aproveitei a barraca de água de coco e me reidratei um pouco - o sol estava REALMENTE escaldante - pra aguentar seguir subindo. Ao chegar no segundo mirante, alguns quilômetros a frente, a visão me deixou pasmo.

Obviamente a fotografia não chega aos pés da visão ao vivo, nem passa a sensação da grandeza da natureza que pude presenciar lá do alto, muito menos permite ouvir ao longe o barulho das ondas e o vento úmido soprando suave no rosto.  A vista do alto é espetacular e merece ser vista ao vivo.

Itacaré/BA
O dia seguiu bem difícil, cheio de altos e baixos, até chegar ao finalzinho do dia na cidade de Itacaré, a tempo de flagar um belíssimo por do sol a beira mar. Aproveitei e me dei um jantar de rei, parando na barraca em frente ao mar e comendo um belo peixe assado. Nada como comer assistindo o mar banhado pelo luar. Fui pra pousada e dormi um belo sono.

Ao amanhecer, tive um sério problema: não havia como eu sacar dinheiro na cidade! Estava sem nenhum tostão no bolso e me alertaram que seria a mesma situação por muitos quilômetros a frente. Fiquei apavorado em saber como seguiria. Fui até um posto de gasolina e pedi a gentileza para o gerente me arrumar R$ 20,00 (tirado do meu cartão de débito) para que eu tivesse com o que seguir adiante.

Com o dinheiro controlado, teria que ser bem econômico no trajeto. De fato fui, pois não havia onde comprar água por quase todo o caminho. Passei muita sede no trajeto, especialmente com o sol que insistia em maltratar. Apenas muito a frente eu localizei um oasis, onde pude comprar água de coco e completar minha água, o que me deixou com R$ 12,00 de saldo na carteira.

Camamu/BA
Meu destino foi Camamu. Uma cidade curiosa em sua arquitetura, cheio de ruas estreitas e vários barcos pescadores. Pra variar, sempre em meios a muitos morros. Recebi uma atenção especial de alguns moradores, especialmente após explicar meu problema com dinheiro. Foram andando ao meu lado, me levando pousada a pousada até encontrar uma que aceitasse meu cartão. Fizeram o mesmo com o restaurante, mas não tivemos a mesma sorte.

Enfim, pude almoçar com os R$ 12,00 que tinha e seguir viagem no dia seguinte, levando, é claro, água extra para dar conta do percurso.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Costa do Descobrimento

Porto Seguro
Um belo amanhecer ensolarado. Foi isso que encontrei em Porto Seguro após tanta chuva seguida. Tive privilégio de um farto café e segui pra bicicleta. Pelo caminho, muito movimento, praia e areia, coisas que não via há algum tempo.

Seguir a beira-mar tem uma grande vantagem - tudo é praticamente plano. Desta maneira pude sustentar uma boa média por um longo tempo e aproveitar melhor a paisagem e a brisa no rosto. Minha primeira parada foi em Santa Cruz de Cabrália, tanto para uma água de coco como para um pouquinho de turismo. Pude fotografar o local da primeira missa no Brasil, onde ergueram uma enorme cruz na comemoração dos 500 anos da colonização portuguesa. Tive também algumas conversas sobre Vicente Pinzón e Duarte Pacheco. Sabia que meus estudos de história seriam úteis algum dia!

Balsa para Belmonte
Enfim, fotos tiradas, continuei seguindo a região chamada "Costa do Descobrimento". Várias belas praias compunham o lugar, bem como uma fartura de lugares para reabastecer-me. No entanto desta vez não precisei de muitas paradas, já que a pista parecia um tapete, totalmente nivelada, e não poderia ser mais perfeito para pedalar. Minha próxima parada foi a balsa rumo a Belmonte.

Depois da balsa, o ritmo intenso prosseguiu até Belmonte, onde fiz pequenos reparos na minha bicicleta e fui procurar a lancha que fazia a travessia do mangue até Canavieiras. Existia outras duas possibilidades: uma era pela estrada em construção BA-001, outra era pelo mangue. Como meu prazo para chegar em Recife está começando a ficar apertado, fui pela rota mais segura. 

Praça em Belmonte
"Se" a estrada em construção estivesse em boas condições, teria levado menos tempo por lá, mas não consegui nenhuma informação confiável sobre isso. Meu medo era que faltasse alguma coisa, como uma ponte, e me fizesse perder tempo. 

Uma pena que o pequeno filme que fiz não dá a real noção de como é andar pelo meio do mangue, abaixando a cabeça para não bater em nenhum galho e as vezes tendo a impressão de que a lancha irá se chocar no meio do mangue. Foi uma experiência interessantíssima, especialmente pela bela paisagem. Mais um bicho pra coleção de animais que avistei nesta jornada. Desta vez foi um boto. Pena que não pude registrar.


Quando cheguei a Canavieiras, recebi um verdadeiro choque! Que cidade linda! Até então nunca havia ouvido falar neste lugar. Tudo muito bem conservado, muita circulação de bicicleta e uma limpeza fantástica. Não avistei nenhum vandalismo ou pixação. Lugar exemplar! Ao primeiro cidadão que paro para perguntar sobre pousadas, mais outra agradável surpresa. Além da orientação, recebi um convite para jantar!



Canavieiras
Eram dois estudantes que, por problemas com o ônibus da prefeitura, perderam a aula na faculdade de Ilhéus. Pessoas muito simpáticas com as quais tive uma conversa inteligente ao longo da noite. Afinal, companhia sempre é bem-vinda. Ao final, não me deixaram pagar a conta.

Insistiram ainda que, pela manhã, passasse na casa de um deles, o Bruno, para que ele me levasse para um passeio pela praia. Ele foi estudante de turismo e me apresentou não somente os lugares da cidade como também contextos históricos e outros detalhes, tais como arquitetura e economia, que me permitiram ter a experiência de um verdadeiro tour.

Eu, Bruno e João
Ao final, recebi uma fita do Nosso Senhor do Bonfim. Não acredito nestas coisas, mas vou manter a fita no meu pulso como recordação. Enfim, por causa deste passeio matutino, acabei saindo de Canavieiras por volta das 12h00, mas sem arrependimentos. A partir desta cidade acaba a Costa do Descobrimento e começa a Costa do Cacau.

sábado, 23 de outubro de 2010

Bahia adentro

Alvorecer na Praia do Sossego
Despertar no paraíso é uma experiência inesquecível. Ao sair da minha barraca, me deparo com um belíssimo nascer do sol. Não esperava a visão linda, a brisa do mar, o barulho das ondas e a noite otimamente dormida. Meus novos amigos ainda descansavam da cerveja da noite anterior e assim ficaram por mais umas duas horas.

Fiz meus preparativos pra sair. Todo o ritual leva cerca de 1h30, incluindo o desmonte da barraca. Aguardei um pouco que despertassem para me despedir e prosseguir pelas trilhas.

Após sofrer tanto para entender o caminho, aprendi finalmente que o Picadão era a "avenida" em meio aos eucalípitos que cortava praticamente todo o trecho sem precisar seguir até as praias. A partir daí ficou muito fácil quase completar o percurso. Digo "quase", pois o Picadão acabava, depois seguia por dentro de uma fazenda.

Tive que atravessar por dentro de um riacho e também atravessar um longo trecho de areia antes de alcançar o rio Mucuri, porta de entrada da cidade de Mucuri. Apesar do percurso ter sido bem puxado, ainda estava cedo e eu tinha disposição para seguir adiante. Peguei a estrada de terra rumo a Nova Viçosa esperando chegar logo por lá. No entanto tive um grande susto.

Rodovia Estadual
Apesar da estrada de terra ser uma rodovia estadual, não demorou muito para que eu percebesse que não levaria a lugar algum. No final a rodovia se dividia em três direções: a mais reta terminava em uma porteira trancada com cadeado, a mais a direita atravessava duas grandes depressões e um rio. A terceira seguia rumo aos eucaliptos, que foi a que escolhi seguir.

É simplesmente impossível se encontrar dentro dos eucaliptos sem um mapa. Fiz zigue e zague por horas, avançando sempre muito pouco dentro da plantação. Foram horas de desespero tentando saber pra onde ia, pois não me achava mais nem pra seguir adiante nem pra voltar.

Por sorte, depois de muito tempo, encontrei uma via principal com moradores. Me informaram que seguindo esta via em linha reta, terminaria na BR-101. Apesar de temer esta rodovia, seria ótimo sair do lugar que estava. Segui em frente, passando por vários vilarejos pobres até chegar na BR.

Já era final do dia e a rodovia simplesmente não tinha acostamento. Era somente mato. Conforme caia a noite, ficava cada vez mais apavorado e sem rumo. Não havia qualquer hotel pelo caminho. Acabei tendo que caminhar na escuridão da BR, com os caminhões rasgando a rodovia. O descanso aconteceu em um posto de gasolina.

Portal de Teixeira de Freitas
Novamente bem cedo, prossegui para Teixeira de Freitas. Em 20km alcancei a cidade. Infelizmente achei o lugar bem mal cuidado. Como meu pneu estava muito desgastado, aproveitei a cidade e coloquei um novo pneu, pois o anterior estava muito rasgado. Ao retornar a BR, em cerca de 30 minutos de pedalada, o pneu estourou. Ficou um grande buraco que dava para colocar o indicador até a câmara. Achei melhor remendar o pneu e continuar a pedalar, o que foi um grande erro.

Neste trecho minha câmara furou um total de 8 vezes, até que eu desisti de vez de tentar reparar. A noite vinha caindo e ainda estava cerca de 15km de Itamaraju, próximo a descida da serra. Dei uma grande sorte quando um motorista me viu empurrando a bicicleta na descida e resolveu parar e me convenceu a pegar uma pequena carona neste trecho. Esta decisão me salvou de uma noite bem difícil empurrando a bicicleta.

Avenida em Itabela
A cidade era bem cuidada, com a bela visão de um monte por toda a cidade. Aproveitei o tempo extra para passear a noite e fazer um ótimo jantar. Pela manhã mais uma ótima notícia: A BR-101 possuia acostamento a partir deste ponto. Aliás, um bom acostamento, totalmente asfaltado. Minha viagem até Itabela foi prazerosa, com direito a pontos para água de coco.

Itabela é uma cidade de poucos atrativos, tendo poucas opções de pousada e de refeição, mas suficientes para me recuperar para o próximo dia.

Finalmente seguiria rumo a uma cidade que estava ansioso: Porto Seguro. Sempre quis conhecer a cidade. Havia um caminho de terra mais direto e um mais longo via Eunápolis. Optei pelo mais direto.

Vilarejo antes de Vera Cruz
Muita chuva pelo caminho e muita serra, pude conhecer pequenas comunidades extremamente pobres, por dentro de vias inacessíveis até mesmo de bicicleta, onde empurrar foi tarefa árdua que durou horas.

Muitos lugares não tinham energia e muito menos qualquer comércio, até alcançar a cidade de Vera Cruz. Pude me reabastecer de água e comprar alguma coisa pra comer e continuar a jornada.

Ao sair da pequena cidade, a chuva intensificou ainda mais e a pedalada ficou cada vez mais difícil. Nunca esperei passar tanto frio na Bahia quanto experimentei neste dia. Nem parecia com o lugar de sol que tanto ouvi falar.

Portal de Porto Seguro
Minha chegada em Porto Seguro foi embaixo de uma baita chuva e acabei não conseguindo ver muito pela cidade na noite. Segui até o centro e procurei um lugar barato para a noite, o que acabei encontrando rapidamente.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Nordeste

Praia deserta no ES
Como habitual, recomecei a jornada no primeiro raiar do sol. A espelunca que estive não tinha café da manhã e não havia nada aberto para me abastecer. Saí com pouca água e nenhuma comida. Pelo caminho apenas vilarejos e nenhum lugar para me reidratar.

Muitas praias passavam ao meu lado, todas completamente distantes da população. Como estava uma leve chuva, era difícil encontrar qualquer pessoa na rua, e meu trajeto foi quase que sem paradas.

Trilha rumo a Conceição da Barra
A única grande cidade que passei no trajeto foi São Mateus, mas que logo ficou pra trás. Estava com muita pressa. Escolhi sempre as trilhas mais diretas que apareciam em meu GPS, tanto para evitar a temida BR quanto para usar o menor caminho. É claro que esta minha decisão sempre me leva pros caminhos mais estranhos possíveis.

Enfim, consegui chegar em um único dia a Conceição da Barra, num percurso de pouco mais de 100km. Estou desenvolvendo um ótimo ritmo, especialmente neste terrenos quase que planos onde estou passando.

Fiquei numa pousada administrada por dois velhinhos super simpáticos e amorosos. Adorei o lugar. Cuidavam de aves e se orgulhavam por terem ninhos de pica-paus e de uma ave rara, cujo nome não me recordo, na mesma área da pousada. Enfim, gente que espero reencontrar. Me deram algumas dicas para a viagem, especialmente para algumas assaduras que tive no caminho, pois a estrada de terra era cheia de "costelas de boi" que me machucaram muito.

Por falar em machucados, esqueci de mencionar na outra ocasião, ainda em Vitória, que fui ao médico verificar o que estava acontecendo com minha mão, que vinha doendo desde o tombo em Bananal/SP. Diagnóstico: Fratura no pulso. Desde então venho convivendo com um apoio para o pulso que vem me ajudando a evitar as dores durante a pedalada, mas que está longe de resolver o problema.

Comi e Dormi muito bem na cidade e comecei o dia um pouco mais tarde, quase as 11h00. Queria dar um descanso aos assados e ter um dia mais tranquilo. Segui rumo a Itaúnas. No caminho tive o prazer de encontrar outro ciclista, de moto, que me acompanhou uma boa parte do trajeto.

Estrada para Itaúnas/ES
Como a chuva não deu trégua, a estrada para lá estava um verdadeiro lamaçal. Era difícil beber água na caramanhola sem sentir o gosto do barro. Fora a sujeira, a estrada em si tinha pouco movimento e estava suficientemente sinalizada. Como o percurso também era curto, não foi um trajeto particularmente difícil.

Minha chegada em Itaúnas foi tranquila, com direito a água de coco e pensão boa e barata. Não tinha café da manhã, então providenciei vários mantimentos no mercadinho da frente e ainda aproveitei para passear pelas famosas dunas. Dormi bem cedo e acordei um tanto tarde, as 07h00. Segui viagem as 08h00, mas com pouca informação sobre direção.

Iria atravessar um trecho que soube depois pertencer a Suzano Celulose. Eram plantações imensas de eucalípitos, onde era muito fácil se perder. A primeira coisa que fiz assim que avistei uma placa foi seguir em direção ao litoral, rumo ao Riacho Doce/BA. Era uma belíssima praia e havia recebido orientação do pessoal para seguir por ela, que seria o melhor caminho.



Ledo engano. As informações que recebi estavam erradas. Não é possível transpor a praia em qualquer período do ano, apenas conforme a maré. Tive que voltar as quase 1h30 de percurso, perfazendo 3hs de prejuízo no trajeto. O jeito foi segui até a próxima praia pelos eucalíptos.

Costa Dourada
Com muita dificuldade consegui atingir Costa Dourada/BA. A praia é simplesmente perfeita. A cidade sempre composta de grandes casas e belas pousadas, parecia ser um retrato do paraíso. Minha permanência neste lugar foi incrivelmente curta, pois me foi dada a informação que a única forma de chegar a Mucuri, minha próxima parada, seria de balsa e que a última partiria as 17h30.

Com disposição renovada, sai como um disparo em direção ao rio da travessia. Claro que quando não sabemos pra onde ir e vamos mais depressa, a única coisa que conseguimos é nos perder mais rápido. Fiquei em meio a plantações sem saber como sair de lá, até que começou a anoitecer. Rapidamente fui rumo a Praia do Sossego, a última da região e que não dispunha de qualquer infraestrutura, muito menos pousadas. Esperava localizar um bom local pra acampar e, se tivesse sorte, comer. Na primeira casa que pedi informações, fui convidado a entrar, comer e passar a noite.

Foi uma bela noite, com direito a churrasco, muita boa conversa e um bom banho. Minha noite foi na barraca num repouso muito tranquilo. Precisava realmente de um pouco de descanso.